sexta-feira, 4 de junho de 2010

Interromper uma gravidez – parte IV

Que mulher nunca ficou encanada com um atraso? E por outro lado, quantos casos de mulheres que estavam grávidas e nem imaginavam?

Fato é que... acontece.

E a primeira coisa que a gente faz é tentar se convencer de que é normal, que não há de ser nada. Afinal de contas, é normal que quando os níveis de pressão, estresse, dor, perda ultrapassam o que já estamos acostumados a suportar no dia a dia, o ciclo se desregularize. Mas, é claro que, conforme o tempo vai passando, não há como não começar a se questionar e pensar no "e se..."

Sim, a gente pira.

Porque se não for só um atraso, mas uma gravidez, tudo pode mudar. E aí a gente começa a avaliar quais são as condições: trabalho, grana, ajuda, tempo, casa, condição do relacionamento. Claro que, normalmente, não são as ideais. Mas às vezes o instinto maternal fala mais alto (por mais medo que dê, por mais que a gente não se sinta preparada, não se anime com a idéia de trocar fraldas...) e isso acaba entrando em um embate com a idéia de encarar um aborto – que pode ser necessário, mas que não é um processo nada, absolutamente nada fácil.

Há pessoas que não tem a menor dúvida de que não querem e não pensam duas vezes em optar pelo aborto, e não consigo acreditar que esteja errado. Acho que muito mais errado é colocar no mundo um filho que não se quer e não se tem disposição para amar, ensinar e cuidar. Um filho que terá que carregar o peso das frustrações da mãe e que provavelmente não será a melhor das pessoas, no sentido de talvez também não saber amar, de não se importar com o sentimento dos outros – assim como não se importaram com o dele – e não ter medo de machucar nem de ser machucado (no sentido mais geral), de não dispor de um senso mínimo dos valores de respeito à vida.

Não, obviamente nada é tão simples, geral e automático assim. O entorno sempre fará a diferença – para o melhor ou para o pior – e pode que uma pessoa dessas encontre outras no caminho que lhe dêem mais sentido e noção da vida – uma avó que vê no neto a possibilidade de dar a atenção que não pode dar aos filhos, uma professora ou mesmo alguém como meu pai que resolveu dar atenção e conteúdo aos adolescentes que por um motivo ou outro não dispunham do mesmo em casa.

Mas voltando ao assunto inicial, para completar a pira do lance do atraso, temos que encarar o receio do informar – e possivelmente ser mal interpretadas. Ou seja, que a pessoa que "ajudou a fazer" pense que cometemos a insanidade de deixar que acontecesse de propósito (para amarrar, para salvar o relacionamento ou qualquer coisa do tipo). Some-se a isso o receio de encarar uma reação agressiva, tempestiva, raivosa, desesperada, ameaçadora, etc. Apesar de tudo isso, muitas vezes, acabamos contando, afinal não foi algo que fizemos sozinhas, além de sempre termos a esperança de encontrar naquela pessoa um pouco de segurança e estabilidade em meio a bagunça de sentimentos e insegurança em que nos encontramos. Se contamos, é porque a necessidade de dividir toda essa angustia e insegurança se sobrepõe à vontade de ser auto-suficiente e capaz de resolver por conta própria sempre.

E há poucas coisas no mundo piores do que a falta de compreensão e apoio em um momento como esse, justamente da pessoa que gostaríamos e esperávamos que estivesse do nosso lado. É uma das coisas mais amargas e secas de se engolir. Na verdade, não dá para engolir, fica ali: preso a garganta, voltando aquele gosto, parece que para sempre. É triste demais.

Por isso peço: por mais desesperados que possam ficar com a idéia, por favor, meninos, procurem manter a calma e dar um mínimo de apoio. É tudo o que precisamos em um momento como esse, pois qualquer que seja o resultado, será traumático. E tudo o que precisamos é de um pouco de energia estável, um cadinho de segurança, um ombro. Não queremos uma decisão imediata, não esperamos planos nem um pedido de casamento, só esperamos ganhar um abraço e a sensação de que não estamos sozinhas em meio a essa tempestade. Mas ironia do destino, parece que justamente quando mais precisamos é quando menos podemos contar. Isso é o que mais nos seca por dentro. Isso é o que espero não aconteça mais – com mais ninguém.

E o que fazer quando descobrimos que nosso ponto de equilíbrio pira mais que a gente? Puxamos o freio de mão e aprendemos a nos auto-equilibrar, e não descansar, e não fechar os olhos, e não se entregar, e não sentir, e não confiar, e não esperar, e não se iludir, e não sonhar...

...

Quando descobrimos que não passava de um atraso sempre vem aquele alívio, acompanhado sim de certa tristeza, no meu caso, por já ter entrado em processo de aceitação e por tudo que se teve que passar de certa forma em vão, mas que não se apagará.

Apesar de que, começo a me perguntar se isso não ocorre justamente para descobrirmos qual o tipo de homem que aceitamos ter ao nosso lado (mesmo que às vezes um lado tão distante). Sim, entendo perfeitamente que se pudéssemos (eu-razão) escolher, escolheríamos melhor, mas, nem por isso podemos aceitar tudo. Tem de haver limite no que é possível se aceitar e relevar. E aí está. - E quem nunca sofreu uma desilusão que atire a primeira pedra.

Para terminar, apesar de ter muito mais para falar, quero deixar meus profundos agradecimentos e reconhecimento a todos os homens que não se acovardaram na hora de cumprirem minimamente seu papel. Um homem pode ser tudo, menos covarde. – Aprendam meninos, por amor, aprendam.

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